Tratamento Psicanalítico de curta duração: conclusões possíveis
Aconteceu, no dia 15 de dezembro de 2007, a I Jornada do CPCT-MG, com a presença de Bernardino Horne como convidado. Quatro eixos de trabalho orientaram a seleção de casos para discussão: o tempo de tratamento, a gratuidade, a transferência entre consulta e tratamento e a experiência da supervisão. Foram discutidos oito casos, escolhidos entre os 16 enviados para seleção, com a presença entusiasmada dos participantes do CPCT. Num ambiente ao mesmo tempo sério e descontraído, retiramos das nossas discussões um produto que foi apresentado, ao final, abrindo para nós novas perspectivas de trabalho. Seguem-se os pontos destacados:
1. Bernardino Horne enfatizou que os CPCT representam o futuro da Psicanálise, na medida em que neles temos uma clínica não ocultada pela teoria, ou seja, a matéria bruta da Psicanálise do futuro.
2. Na questão do tempo introduziu-se um luto não elaborado, presente em pelo menos metade dos casos discutidos. Os efeitos terapêuticos rápidos se produzem aí quando se escuta a dimensão pulsional que está em jogo.
3. O que é um ciclo? Um ciclo implica uma redistribuição de gozo, com um ganho de saber e um resto. Podemos falar de ciclo na psicose? Um ciclo afrouxa o nó sintomático para amarrá-lo de outra forma. Formulou-se a hipótese de que um ciclo termina quando se toca algo da posição feminina.
4. O nome de gozo isolado em cada caso pode ser provisório e articula a entrada com a saída. Trata-se de passar de uma versão do supereu para uma versão do pai como aquilo que faz nó. Ex. “a salvadora da pátria”, “a mulher do armário”, “o bom moço”, “a bagunceira” etc.
5. A retificação subjetiva ou implicação do sujeito é articulada ao instante de ver e ao momento de concluir. Trata-se de uma retificação do estado de satisfação da pulsão. Temos aí uma pragmática relativa ao problema libidinal a ser tratado: saber fazer com o sintoma abrindo mão da questão da verdade. Trata-se de uma pragmática do uso do objeto a, sem divã. Os efeitos terapêuticos não se obtêm convencendo o paciente, por sugestão, ensinando-o, mas circunscrevendo um ponto de gozo. Destacou-se a idéia de um bom resto: o medo da recaída é articulado a um saber sobre a repetição.
9. A dificuldade de separação se articula a um defeito na alienação: o lugar da consulta é, portanto, isolar o lugar do sujeito na relação com o Outro, seus pontos de fixação e de identificação. O par alienação/separação introduz-se na questão da gratuidade.
10. O que é a gratuidade? Todos nós pagamos alguma coisa, aprendemos com o que pagamos. O paciente só pode pagar quando sabe do que se trata. Perguntou-se se o tratamento privado poderia ser gratuito. Pensou-se que não: é uma questão para ser mais trabalhada. A gratuidade é um operador que permite a presença do analista, parceiro do sujeito como resposta do real. Se o analista não joga sua partida com a Psicanálise, não há CPCT. O que permite operar com a gratuidade é a curta duração. O desejo do analista permite operar com sujeitos que não querem ser analisantes. O trabalho analítico não é, no entanto proporcional ao preço que se paga. A gratuidade é um semblante, pois pagamos cada um, com o íntimo do nosso ser. O CPCT é um lugar de formação.
11. Podem-se distinguir estratégias diferentes na neurose e na psicose. Na neurose tratar-se-ia principalmente de introduzir a tiqué, na psicose trata-se de introduzir uma regularidade. Na psicose a gratuidade pode surgir como um enigma, levando a supor um gozo no Outro. Os intervalos de tratamento seriam diferentes de ciclos? A idéia de o psicótico estar sempre em tratamento opõe-se às soluções “joyceanas”.
12. A supervisão é procurada para:
– pensar essa nova prática: um desafio que exige invenção
– isolar um ponto de gozo a ser tratado
– liberar o praticante da inibição
– imprimir a pressa
– intervir na infinitização do tratamento
– discutir o encaminhamento: prolongar ou encerrar?
Qual a especificidade da supervisão no CPCT? Deve-se levar em conta o tempo, a gratuidade e a separação entre consulta e tratamento.
Bernardino fala sobre a experiência da EBP-Bahia: cartéis com consultores e praticantes e supervisão dos casos nos cartéis, com eventuais convidados. É uma forma de acompanhar e aprender com os casos, transmitindo a experiência. A supervisão não é pedida eventualmente, mas sistematicamente.
Parece interessante como proposta alternativa entre nossa reunião geral e a supervisão individual e eventual, possibilitando efeitos de formação e controle da nossa nova prática, fundamentais para a construção de um saber sobre o que fazemos.
Revalorizamos a divisão entre consulta e tratamento: a consulta como forma de isolar o ponto de gozo a tratar, destacar as linhas de força do caso e orientar o tratamento. A supervisão e as equipes de consulta e tratamento ficam à espera de uma nova configuração em 2008.
13. A divisão entre consulta e tratamento deve ser sustentada no atendimento de crianças e adolescentes? No tratamento de crianças deve-se apostar no tratamento do seu gozo, sendo às vezes necessário, no entanto, orientar um Outro desorientado. Bernardino e Jésus Santiago lembraram que o lugar alpha, introduzido por Jacques-Alain Miller, não é um lugar de escuta, mas de resposta. Não importa o lugar físico. É possível pensarmos em intervenções coletivas, onde se faça circular a palavra no lugar de atos violentos. O analista pode ser um objeto nômade e o sujeito suposto saber é deslocado para o próprio sujeito. Qual a especificidade da transferência no CPCT? O sujeito suposto saber é secundário, o elemento fundamental é o amor, como propôs Miller em Comandatuba, porque os sujeitos não chegam pela via do inconsciente transferencial, mas do inconsciente real, dos S1 sozinhos, e o analista faz aparecer o saber do lado do sujeito.
14. O que é psicanalítico no nosso trabalho? Devemos ter essa questão sempre presente no nosso cotidiano no CPCT, tanto no trabalho de atendimento quanto nas reuniões. Essa nova clínica, em gestação, responde a um novo estatuto do Outro. Trata-se de uma resposta do CPCT a uma ausência de resposta do Outro, para que viva a Psicanálise.
15. Propõe-se um boletim interno que se sustente regularmente.
Elisa Alvarenga
16.12.2007