A II Manhã de Trabalho do CIEN Brasil ocorrerá em São Paulo, no dia 19 de novembro de 2010, das 9:00 às 13:00, por ocasião do VXIII Encontro Brasileiro do Campo Freudiano – Escola Brasileira de Psicanálise. Esperamos dar continuidade à série, inaugurada no Rio em 2008, que privilegia a conversação sobre as experiências dos laboratórios do CIEN no Brasil. Este Boletim 01 inicia uma outra série que pretende oferecer informações, textos de orientação e bibliografia concernentes ao nosso tema « A disciplina dos corpos e suas respostas », e apresentar-se como um espaço de publicação das contribuições dos colegas ao longo deste período preparatório ao nosso encontro de novembro. Vinhetas dos laboratórios, comentários de filmes, textos, as mais diversas produções literárias e culturais serão bem-vindos. Neste número, publicamos um argumento para iniciarmos nossas reflexões assim como informações sobre inscrições e apresentação de trabalhos. |
A disciplina dos corpos e suas respostas Boletim Informativo 01 junho de 2010 |
A disciplina dos corpos Cristiana Pittella de Mattos O que é um corpo? Como cada saber concebe o corpo? Vários são os campos de saber que tentam disciplinar o corpo. Cada vez mais nos deparamos com exigências de normalização do corpo através de condutas preventivas, medicamentosas, de correção e/ou punição: corpo que se manipula, que se silencia, que se controla e impõem obrigações, treinamento, limites e proibições. Encontramos estas ações também nas estratégias para tornar o corpo ainda mais saudável e capacitado. Mais útil e mais dócil. Da excelência no desempenho intelectual e físico à fascinação performática, o corpo acaba se tornando um corpo consumido pelo saber, técnicas, esforço, trabalho e vaidade. O corpo está cada vez mais qualificado, mensurado, avaliado e hierarquizado face às gestões do comportamento. Não é isso mesmo que nos diz Foucault? O homem, durante milênios, permaneceu o que era para Aristóteles: um animal vivo e, além disso, capaz de existência política; o homem moderno é um animal, em cuja política, sua vida de ser vivo está em questão (Foucault, 1984, p. 134). Uma política que consiste num trabalho sobre o corpo, numa manipulação calculada dos seus elementos, gestos e comportamentos: o corpo entra numa maquinaria de poder que o esquadrinha, o desarticula e o recompõe. O saber traz consigo um poder que incide sobre o corpo. Por outro lado, o corpo e seus modos de satisfação produzem saber. O que a psicanálise tem a dizer? Se por um lado os discursos incidem regulando o corpo, por sua vez, há em nossos dias uma exigência e injunção para se obter e alcançar cada vez mais satisfação acarretando uma desregulação. Na II Manhã de Trabalhos do CIEN-Brasil nos reuniremos para conversar sobre A disciplina dos corpos e suas respostas. Cada Laboratório do CIEN está convidado a investigar qual tratamento é dado ao corpo em suas práticas e campos interdisciplinares. E também a pensar sobre as questões trazidas pela disciplina dos corpos, procurando localizar as manifestações e respostas das crianças e adolescentes verificando se elas encontram um lugar para alojar seu corpo ou ainda, construí-lo. Lançamos algumas interrogações, certamente inúmeras outras surgirão na rotina dos laboratórios e em nossa Manhã de trabalhos: · Diante da exigência e expectativa de um gesto eficiente, há lugar para a ginga nos esportes e para as palavras na dança da vida? · Jacques-Alain Miller ressalta o quanto o estágio do espelho nas mãos de Lacan ilustra os poderes da imagem, ora da imagem de si, ora a imagem do outro (Opção Lacaniana n. 54, p. 15). As crianças e adolescentes fazem uso da imagem para construir um corpo transformando-se. – Corpo como forma total, forma adorada? – Corpo como um ordenamento da imagem pelas insígnias e emblemas? – Ou ainda, corpo como um modo de satisfação? · A forma, a aparência, os apetrechos colados, acomodados e inseridos nos corpos, as imagens e escrituras gravadas na pele, teriam funções em sua disciplina? · Em nossas práticas podemos acompanhar as invenções e os diversos modos que as crianças e adolescentes encontram para ter um corpo. Como podemos reconhecê-las? Elas permitem um laço social ou elas rompem com essa possibilidade? · Como podemos criar espaços que acolham o modo de cada um regular seu próprio corpo? Possibilitando-lhes um tempo para encontrar seu próprio jeito e ritmo, sua maneira de se virar e se fazer presente junto ao saber, aos semelhantes e às autoridades. · O corpo da criança/adolescente é, em algumas situações, visto como um corpo vitimado e muitos são os dispositivos criados para lhes dar um espaço de tratamento. Esses espaços possibilitam a emergência do sujeito, de um trabalho que o permita dar uma significação a sua existência e construir uma ficção? · As crianças e adolescentes respondem aos espaços em que reinam a biopolítica, as técnicas disciplinares, o olhar sobre seu corpo, os discursos e estratégias higienistas. Quais recursos encontram e quais respostas constroem para que seu corpo não seja reificado, tomado como um organismo e seus processos vitais? · Quais as brechas os laboratórios do CIEN encontram, em suas práticas interdisciplinares, para o desejo e a palavra da criança? E para a sexualidade e suas respostas? Espaços que levem em conta a história de cada um e suas possibilidades de subjetivação. · E ainda: o que podemos aprender com algumas práticas, disciplinas e saberes que incluem em seu fazer o tempo e o saber-fazer com o corpo de cada criança e adolescente? Aprender com aqueles que não reduzem a condição humana ao estado de animal laborans (ARENDT, 2002) e criam espaços de experiência formativa, onde o desejo reina sobre as necessidades vitais. Alguns campos poderão nos orientar neste trabalho: a disciplina dos corpos nos espaços da Educação, da Saúde, das Artes, dos Esportes, da Religião e nos espaços Jurídicos. Que a partir das pesquisas e do trabalho de cada um, de cada laboratório e dos colegas das disciplinas as mais diversas – interessados na infância e adolescência –, possamos compartilhar em torno do CIEN nossos achados. |