Número 19 |
16 de abril de 2011 |
Editorial |
Neste número, trazemos uma notícia sobre as atividades Preparatórias para o V ENAPOL. Compartilhamos, através do texto de Maria Noemi de Araújo, as ressonâncias produzidas por conferência de Iordan Gurgel em “Noites Americanas”, atividade promovida pela Biblioteca da EBP São Paulo. Noemi tece um comentário sobre o objeto artístico e sua criação na literatura e no cinema, para nos dizer do modo como a noção de loucura, presente no senso comum, foi incorporada pela arte. Aproveitamos a ocasião para c onvidamos os colegas que tenham apresentado trabalhos sob a rubrica “Preparatórias”, a enviar seus textos para o Diário do Americano, como arquivo anexo para lucí[email protected]. O e-mail deverá ter como assunto PREPARATÓRIAS. Convocamos as Escolas, suas seções e delegações, nos quatro cantos de nossa vasta América, a compartilharem as ressonâncias produzidas por ocasião das atividades preparatórias para o V ENAPOL, através de uma breve nota, comentário, ou pequeno texto, de no máximo 1500 caracteres, com espaços incluídos. Os que quiserem colaborar poderão enviar sua contribuição como arquivo anexo para lucí[email protected]. O e-mail deverá ter como assunto PREPARATÓRIAS-RESSONÂNCIAS. Não deixem de conferir as resenhas elaboradas pela Comissão de Bibliografia, e matéria de divulgação do V ENAPOL no Globo on line! Lucíola Freitas de Macêdo p/ Edição do Diário do Americano |
Aconteceu… |
“De um bando de loco maluco beleza“ Maria Noemi de Araújo … Na conferência « A Saúde mental e a loucura de cada um”, Iordan Gurgel, ao usar como epígrafe a frase “de perto ninguém é normal”, apresentou uma reflexão singular a respeito de algo da loucura do psicanalista e abriu uma janela ao diálogo entre a psicanálise lacaniana e os usos da tradição oral constituída no tecido social, e vice-versa. Além de evocar a noção de arte como “dejeto” (Miller), apostou-se numa discussão de aspectos da eficácia da prática psicanalítica que vem “infestando” a vida cotidiana das instituições: Como um “cochicho” entre um doente e alguém da cozinha ou da “faxina” pode produzir “furo” no discurso do especialista? … o que de novo, esta “peste” apresenta? Destaco aqui um aspecto da produção de uma noção específica de louco presente no senso comum incorporada pela arte. Entre tantos, cito o modo como o escritor Lima Barreto organizou uma determinada noção de “loucura”, própria de sua época, tornado-a um objeto literário. É conhecida a inquietação do seu “Policarpo Quaresma” perante as normas (1911). No livro, ao redigir um documento oficial na língua tupi, Policarpo foi internado num manicômio… Esse personagem, construído a partir da experiência do escritor com as práticas da “saúde mental”, mostra algo da singularidade autoral ao incluir elementos de sua convivência pessoal com doentes numa Colônia do Rio de Janeiro (ou antigo hospital psiquiátrico público) onde Lima Barreto viveu dez dos seus quarenta e um anos… No poema “Dois loucos”, de Paulo Leminski, no qual Um passa os dias/ chutando postes para ver se acendem// o outro as noites/ apagando palavras/ contra um papel branco// todo bairro tem um louco/ que o bairro trata bem/ só falta mais um pouco/ pra eu ser tratado também, inspirou Reinaldo Pinheiro e Miriam Chnaiderman a realizarem o documentário “Dizem que sou louco…” Mesmo desconhecendo o nome da música “Balada do louco”, dos Mutantes, muitos cantarolam: Mas louco é quem me diz/E não é feliz, não é feliz/Eu juro que é melhor/Não ser o normal/Se eu posso pensar que Deus sou eu//Se eles têm três carros, eu posso voar... Persiste no tempo a noção de que “todas as famílias felizes se parecem; cada família infeliz é infeliz à sua maneira”. Atribuída a Tolstoi, esta frase inspirou não só o dito popular “toda família de perto não é normal”… traduzida por Caetano como “de perto ninguém é normal”. Eduardo Coutinho diz ter realizado o documentário Edifício Máster para mostrar que “de perto todo mundo é normal”. Ora, “bastou abrir as portas deste edifício” situado em Copacabana, com mais 600 apartamentos, para se ver que “todo mundo delira!”… Ainda pensando nesse tema, na cultura cinematográfica, no recente documentário “Santiago”, o cineasta João Moreira Salles, atualiza a noção de “família feliz” partindo da representação de um dos aspectos da história d e sua família. Nesta obra, Salles produziu um gesto que retificou algo de um laço social desmanchado que inclui o Santiago, o mordomo aposentado da casa…. Ao se deixarem ser vistos, de tão perto, Salles e Santiago se tornaram personagens de uma “feliz” reinvenção, que fez desta a mais louca obra deste cineasta (e de seu personagem), no sentido lacaniano no termo. Ou como diria Gorostiza, “cada um com sua própria, singular e incomparável loucura” marcou a história do documentário brasileiro e dividiu a crítica…. Diferentemente dessa abordagem de Salles, seus precursores documentaram algo da loucura de uma geração que sofreu cortes “reais” da censura do regime militar. O baiano ator de seu próprio filme, Edgar Navarro, se inclui na loucura da própria cena delirante de seu filme “Super Outro”. Trata-se de uma alegoria do delírio vestido de “super homem” perambulando pela capital baiana correndo a pé, ou a cavalo… Já o pernambucano Jomard Muniz de Britto, também ator de seu próprio filme, encarcerou a loucura do personagem de “Palhaço degolado” numa “Casa de Detenção da Cultura”. Este evoca repetidas vezes o “Mestre Gilberto Freyre”, a “Casa Grande” e “Senzala” para satirizar uma homenagem o sociológo Freire e o escritor Suassuna pelo lugar (normatizador) que estes ocupavam na cena política cultural na época. O artista Tom Zé sai do anonimato e faz performances demolidoras de um discurso oficializado (normalizado) pela dita contracultura… As estripulias dessas figuras públicas que fazem do “delírio da normalidade” a sua arte, remontam à noção de arte como “tudo” que “está naquele nada” de Tolstoi (1898). Contudo, arte como algo que “sublima o dejeto” (Miller), indica um modo de “socialização do gozo” integrada ao laço social do artista. Desse modo, a loucura de cada um deles (Tolstoi, Picasso, Barreto, Leminski, Chnaiderman, Seixas, Mutantes, Chico, Caetano, Coutinho, Salles, Santiago, Navarro, Jomard e Tom Zé) produz laço social no “viés pelo qual o gozo” artístico “de cada Um conecta com o discurso do Outro”. (Gorostiza, 2010). Com efeito, naquele “não sem…” lacaniano do título do V Encontro Americano pode ser aqui usado como algo que procurando bem, “todo mundo tem”… Leia mais |
… em Noites Americanas – EBP São Paulo |
Em “Noites Americanas”, a Conferência « A Saúde mental e a loucura de cada um”, proferida por Iordan Gurgel, e coordenada por Perpétua Medrado, privilegiou uma articulação do tema do V Enapol com sua experiência como médico psiquiatra e psicanalista no âmbito da saúde pública na Bahia. Ao comentar esta Conferência, Rômulo Ferreira destacou a questão de uma eficácia no tratamento do dito “doente mental” favorecida pelo modo como os psicanalistas têm participado desse trabalho nas instituições, circulando de maneira mais livre e menos na linha do confronto, como ocorreu há tempos atrás e, de certo modo, sendo dócil à proposta “da saúde para todos”, não sem fazer aparecer a “loucura de cada um”… |
Comissão de Bibliografia – Resenhas |
A Comissão de Bibliografia disponibilizou, no site do V ENAPOL, uma série de resenhas de referências contidas na bibliografia ponderada. Confira abaixo trechos de algumas delas: LAURENT, Éric. Cidades analíticas. In: “A sociedade do sintoma – a psicanálise, hoje”. RJ. Contra Capa, 2007, p. 91-110. Resenha: Maria de Lourdes Mattos (EBP-SP) … a partir de uma referência poética de Lacan sobre o estatuto do inconsciente, comenta sobre o novo modo de considerar o dito de Lacan segundo o qual “o inconsciente é estruturado como uma linguagem”. A referência “o inconsciente é Baltimore ao amanhecer”, foi uma afirmação feita por Lacan em 1966 num colóquio sobre o estruturalismo, na Universidade John Hopkins, localizada na cidade de Baltimore. Laurent considera que nessa afirmação está presente, além das dimensões de lugar e de tempo do inconsciente, a introdução do objeto a… LAURENT, Éric. O analista cidadão. In: “A sociedade do sintoma – a psicanálise, hoje”. RJ. Contra Capa, 2007, p. 141-150. Resenha: Yára Valione (EBP-SP). …É necessário, enfatiza Laurent, o analista sair deste lugar de desidentificador e ocupar o de analista cidadão. O analista deve perceber e entender a comunhão de interesses entre o discurso analítico e a democracia… um analista sensível às formas de segregação… MASEO, Gerado. Un nuevo concepto de inconsciente . Buenos Aires: Grama, 2010. Un nuevo concepto de inconsciente es un seminario dictado por Gerardo Maeso en Enlaces Clínico (2009), continuando su libro anterior: Joyce y Lacan (Grama ediciones, 2008), que orienta la lectura de los últimas seminarios de Jacques Lacan, y su debate siempre constante con Sigmund Freud. Varios son los temas que se articulan en este seminario, y entre ellos se destaca el lugar del psicoanálisis como práctica delirante… NAJES, Ana Ruth. Problemas de aprendizaje y psicoanálisis. Buenos Aires: Grama Ediciones, 2008 . … La afirmación de Jacques-Alain Miller de que « no hay clínica del sujeto sin clínica de la civilización », afirmación que complementa su ya célebre « no hay clínica sin ética », es la guía inspiradora de todo el recorrido que Ana Ruth Najles nos presenta (…) El niño enloquecido, el niño tonto, el niño triste, el niño « fracasado », y tantas otras figuras de la desdicha del hablanteser son deconstruidas en este libro para devolverle al sujeto la dignidad del inconsciente … CALDAS Heloisa. O delírio no cotidiano do amor. In: Latusa digital, nº 42/43, agosto e dezembro de 2011. http://www.latusa.com.br/pdfs/pdf_latusa_digital_42_43_a2.pdf Heloisa Caldas, há muito pesquisa e reflete sobre o amor. No texto que ora nos oferece trata da diferença entre o discurso do amor e a escrita do amor, enfatizando que tanto um quanto outro estão sedimentados em um terreno de semblantes. São vias diversas que tratam do incompatível entre demanda e desejo e servem de tratamento ao gozo pela via do delírio. (Ondina Machado). |
Comissão de Divulgação |
Confira: Globo on line na divulgação do V Enapol
Encontro no Rio vai defender valorização da loucura individual na busca pelo bem-estar coletivo Diário do Americano – equipe Anamáris Pinto, Andréa Reis, Cristiane Saúde Barreto, Fernanda Otoni de Barros-Brisset, Laura Rubião, Lucíola de Freitas Macêdo (coord.), Tatiane Grova e Yolanda Vilela. Leia mais |