Jorge Mourão
fotografia que ilustra nosso Boletim L’Incs #4 da XXI Jornada “O
inconsciente e a diferença sexual” é da instalação “Atacama – Contagem” do
artista Randolpho Lamonier – uma cama desertificada cercada por objetos de
consumo.
Na abertura de seu Seminário 20 e de
maneira bem-humorada, Lacan apresenta aos seus alunos a não relação sexual. A
cama será a metáfora que acolherá suas primeiras palavras:
“Deixo-os então nessa cama, à
inspiração de vocês. Saio, e mais uma vez escreverei
nessa porta, a fim de que à saída, talvez, vocês possam sacar de novo os sonhos que tiveram prosseguindo
nessa cama. Escreverei a frase seguinte
– O Gozo do Outro, do Outro com A maiúsculo, do corpo do Outro que o simboliza, não é o signo do amor”. (Lacan,
Seminário 20, pág 11).
novo na resposta dada pela escola americana ante ao trabalho entregue pelo
estudante Jasper Finn? Finn é um jovem trans
de 18 anos,
que mora no estado da Virgínia, nos Estados Unidos. Ele decidiu apresentar nocolégio
umtrabalho que valeria créditos para ingresso em universidades, envolvendo dois temas que o cercam:
gênero e sexualidade. A resposta da escola foi censurar seu trabalho e
reprovar o estudante. Nas palavras twitadas por Finn: “a adminsitração da minha
escola me disse para eu parar de me concentrar em gênero e sexualidade porque
isso era inapropriado”.
HERÉTICOS ADOLESCENTES
Crônica de Laurent Dupont
Garoto ou garota, a hora da escolha
herético é aquele que escolhe. Essa dimensão da escolha é muito presente no
ensino de Lacan, desde a “insondável decisão do ser”1 até a heresia
de Joyce no Seminário XXIII, passando pela “escolha forçada”, que Lacan evoca
de maneira exemplar com a fórmula “A bolsa ou a vida”2 – qualquer
que seja sua escolha, você perderá algo!
E se
uma das questões que tocasse o sujeito no momento das metamorfoses da puberdade
fosse a de se fazer herético ao discurso do Outro? E se um adolescente fosse
alguém que se sentisse no dever de se posicionar em relação ao discurso
dominante do grupo, ao qual ele pertence ou se opõe, no pátio da escola, na família,
no grupo de amigos, na sociedade? E se a clínica, nesse momento, fosse a
referência da posição, da escolha, da impossibilidade ou da hesitação em
escolher, daquele cujos apegos à infância se saltam aos golpes infligidos pelas
modificações de seu corpo? E se ser um adolescente fosse ser convocado a ser um
herético?
A segregação homens / mulheres e seu futuro
Aurélie Pfauwadel
Como vai a mais velha segregação do mundo – a segregação homem / mulher – na modernidade.
Os
diferentes “discursos”, tais que definidos por Lacan no final dos anos
60, capturam “séries de corpos” [1] que eles visam submeter. Seja pelo
distanciamento ou pelo reagrupamento dos corpos, eles isolam assim os
gozos. Pois o que se trata de segregar, são sempre os gozos dos corpos. A
principal função do discurso do mestre é de impor as normas ao gozo e
de proceder à contenção de todo gozo Outro ou anormal. Pois bem, qual
gozo é o mais radicalmente Outro, e deve ser o mais urgentemente
abafado, senão o gozo feminino? Daí a estrita separação dos gêneros e o
sequestro dos corpos femininos nas sociedades patriarcais tradicionais.
Em “Televisão”, Lacan sugere que o racismo anti-feminino expressa o
paradigma do ódio frente aos outros modos de gozar: se não há relação
sexual, é que o Outro é de uma outra raça, é o Outro lado do sexo, “na
medida em que estamos separados dele”.
L’Incs: Há algo de novo na sexualidade dos seres falantes em sua articulação com o Incs?
Simone: A articulação da sexualidade com o inconsciente, a meu ver, possibilita sempre o surgimento de algo novo: a experiência psicanalítica dá testemunho disso. No que concerne à sexualidade e sua relação com o inconsciente, os seres falantes se dividem entre os que se inscrevem do lado do gozo todo fálico, os que se inscrevem do lado do gozo não-todo fálico e os que se situam fora do falo, ou seja, aqueles cuja sexualidade não tem nenhuma relação com a norma fálica. Essas três formas de se colocar com relação ao falo possibilitam infinitas maneiras de identificação sexual. Cada época parece dar mais lugar a este ou aquele posicionamento diante do falo. A multiplicidade de identificações sexuais que encontramos hoje em dia, e o surgimento, a cada dia, de novas nomeações, são, a meu ver, em sua maioria, invenções que se situam de forma não-toda com relação à norma fálica ou fora dela. Nossa época é marcada por uma maior expressão e também aceitação dessa pluralidade sexual que se encontra total ou parcialmente fora da norma.
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Jasmine: A irrupção de uma mulher de verdade
Elizabeth Medeiros, Lisley Braun Toniolo
O filme blue Jasmine, de Woody Allen, foi exibido no quarto
encontro da mostra de Cinema e Psicanálise, uma co-realização da Fundação
Clóvis Salgado e da Escola Brasileira de Psicanálise – Seção Minas Gerais. Mais
uma vez o Cine Humberto Mauro esteve lotado e acolheu a proposta de conexão da
psicanálise com a cidade. Ao final da sessão, Antônio Teixeira, nosso colega e
membro da EBP-MG, fez comentários preciosos sobre o filme e causou um debate
vivo na plateia presente
O filme nos conduz através da história de Jasmine, uma mulher rica
que perde todo o seu dinheiro e vai morar em São Francisco com Ginger, sua irmã
proletária, em condições muito diferentes das que vivia até então. O reencontro
com sua irmã, também adotiva e a perturbadora vida que passa a levar em São
Francisco a partir da perda de tudo que a sustentou como mulher, atraem nosso
olhar para essa comédia que não deixa de exibir o caráter dramático dos impasses
que a protagonista enfrenta na relação com o outro. Jasmine, encenada por Cate
Blanchet, ainda que perpassada por uma marcada antipatia, nos captura em sua
trama, fazendo de sua história mais um excelente filme do diretor.
Quanto mais quente melhor
Juliana Saragá
de Psicanálise da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais (FCMMG),
realizado no último dia 24 de junho. Para tratar do assunto, os acadêmicos
convidaram a coordenadora da XXI Jornada da Escola Brasileira de Psicanálise –
MG, Ludmilla Féres Faria, já que a temática perpassa pelo tema central da
Jornada deste ano. Na ocasião, o gatilho para a discussão se deu a partir do
filme “Some Like It Hot” ( EUA, 1959), em português, “Quanto mais quente
melhor”, estrelado pela eterna diva-símbolo do universo feminino, Marilyn
Monroe. O enredo se desenrola no final dos anos 20, quando dois músicos
presenciam a execução de um mafioso em Chicago e, para não serem mortos,
disfarçam-se de mulher e vão tocar em uma orquestra feminina. Joe vira
Josephine e Jerry, Daphne. Elas se tornam “amigas” de Sugar Kane (Marilyn
Monroe) que busca conquistar um milionário. A palestrante inicia trazendo um
questionamento de Clotilde Leguil, autora do livro « Ser e Gênero », já
que o filme trata a questão de gênero com leveza e naturalidade, diferente das
contemporâneas tensões e intolerâncias que versam as atuais discussões.
Ludmilla segue ainda trazendo a leitura da psicanalítica sobre a questão,
desmistificando o olhar preconceituoso, muitas vezes atrelado inadequadamente à
psicanálise.
“…a diferença sexual anatômica é insuficiente para fechar uma pergunta que se impõe comprometendo os corpos” (Pepa Freiría, ampblog2006.blogpot.com.br)
17/08, às 10hs:30 – “O homem não existe”. Comentário de caso do Instituto Raul Soares por Cristiane Barreto;
23/08, às 15 h. – “Se essa rua fosse minha: fragmentos” . Comentário de caso do Programa Consultório de Rua (PMBH). Auditório da Secretaria de Saúde. Comentários por Juliana Motta e Ludmilla Féres;
31/08, às 19h. – “O inconsciente e a diferença sexual : recortes e casos”. Faculdade Newton Paiva.
25/09 às 9 h . – “Masturbação infantil?” Comentário de caso na PUC Coração Eucarístico por Lilany Pacheco.