A relação entre a feminilidade * e a letra[1] foi colocada por Jacques Lacan em inúmeras ocasiões ao longo de seu ensino. [2]
Foi assim que ele pôde ir além do beco sem saída a que Freud chegou com sua teoria fálica e com o chamado rochedo da castração no final do percurso de uma análise. Curiosamente, o termo que Freud encontrou para situar essa dificuldade foi “o continente negro da feminilidade”. Assim, indicou a impossibilidade lógica de representar boa parte da sexualidade feminina de acordo com os parâmetros da geografia fálica; uma geografia métrica em que tudo é medido pela presença ou ausência do símbolo fálico. É, de fato, a geografia que a sexualidade infantil continua a usar para responder à pergunta sobre a diferença entre os sexos e é a que a psicanálise encontrou e continua a encontrar em suas análises. Mas, uma vez que a bússola da lógica fálica foi tomada para mapear a sexualidade feminina, um novo continente se abriu para Freud mais além da localização do gozo no símbolo fálico, uma terra incógnita que segue sendo hoje um lugar de toda sorte de mal entendidos e especulações.
O instrumento cartográfico de Freud era, de fato, a estrutura edipiana com a dialética do falo e a castração, como símbolos da diferença sexual. Ele foi capaz de explicar, assim, boa parte dos problemas colocados pelas neuroses e as identificações sexuais, mas sua lógica colidiu com um real impossível de explicar, especialmente quando se tratava de colocar a singularidade da sexualidade feminina em relação à função da aparência, da mascarada ou do “parecer ser”, como diriam os barrocos. [3]